A inovação impulsiona o progresso econômico e permite ao Estado enfrentar desafios transnacionais, como as mudanças climáticas e as crises globais de saúde. A habilidade de um país de cultivar sua capacidade de inovação está no seu sistema de ensino. Uma força de trabalho bem instruída é fundamental para a descoberta tecnológica e científica, que pode impulsionar a economia global cada vez mais baseada na inovação. Essa necessidade é particularmente acentuada para a China, pois seus líderes buscam impulsionar a economia chinesa na cadeia de valor global.
Em um esforço para promover o desenvolvimento sustentável, os líderes chineses buscaram melhorar a qualidade educacional e aumentar o acesso em todo o país. A política governamental, a Lei de Educação Obrigatória de Nove Anos, de 1986, estabelece dois princípios básicos (liangji): matrícula universal entre crianças em idade escolar (6 a 15 anos) e alfabetização total entre jovens até 20 anos. De acordo com dados da UNICEF, 99% dos chineses entre 15 e 24 anos são alfabetizados, o que significa que conhecem, pelo menos, 1.500 caracteres chineses.
No entanto, o acesso educacional continua desigual na China muito parecido com o que ocorre no Brasil. Os estudantes nascidos em famílias ricas geralmente têm acesso à educação de alta qualidade enquanto os de renda baixa acabam inseridos no sistema público de baixa qualidade. Dados do Bureau Nacional de Estatística sugerem que os residentes urbanos na China desfrutam de uma vantagem de renda quase três vezes maior que seus pares rurais.
A alfabetização é um indicador básico do acesso educacional. Altos níveis de alfabetização servem como base para melhorar o acesso às informações e aprimorar diretamente a capacidade de um indivíduo de contribuir para a sociedade. Desde 2011, a China praticamente eliminou o analfabetismo entre jovens e cidadãos de meia-idade - uma conquista marcante para um país com a maior população do mundo. No entanto, variações provinciais revelam a natureza incompleta do desenvolvimento contínuo da China. Cidades ricas, como Pequim e Xangai, relataram taxas de alfabetização de 98,52% e 96,85% respectivamente, comparáveis às dos países desenvolvidos. No outro extremo, a taxa de alfabetização do Tibete foi de apenas 60,07% aproximando-a de países subdesenvolvidos como Haiti e Zâmbia.
Assim como no Brasil, na China existe o gaokao, o exame anual para entrada nas universidades, que é a versão chinesa do que seria o ENEM ou os vestibulares no Brasil. Durante os dois dias de prova, os estudantes ficam nas salas de aula 9 horas por dia. É um exame muito difícil, focado na memorização e reprodução do conhecimento. É ela que determina em qual universidade o estudante poderá cursar e que tipo de educação terá acesso. Como aqui, os estudantes de maior poder aquisitivo vão para as melhores universidades e os menos favorecidos entram nas universidades de menor prestígio.
Porém, o valor dado à educação e o investimento que pais fazem para que seus filhos possam ir a universidade é bem diferente do panorama brasileiro. A sociedade chinesa mostra grande respeito para com os professores. Para os estudantes, suas palavras são quase divinas. Fazer perguntas e entrar em discussões ou debates está fora de cogitação. A educação é uma parte fundamental da vida dos cidadãos chineses e a maioria das pessoas deposita grande valor em educação de qualidade e nas oportunidades que ela proporciona. Isso não é novidade. Dentro da cultura chinesa, a educação sempre teve um papel central. Dois mil anos atrás, a China foi um dos primeiros países a introduzir um sistema de concurso para definição dos servidores públicos. Os candidatos tinham seus conhecimentos testados e deveriam demonstrar aptidão das habilidades necessárias para o trabalho que aspiravam. Enquanto a Europa passava pela sombria Era Medieval, a China já tinha um sistema educacional extremamente avançado. Mas quando o PCC (Partido Comunista Chinês) chegou ao poder, tudo mudou drasticamente. Durante a Revolução Cultural, um grande número de escolas e universidades foram fechadas, resultando em uma geração inteira de chineses que tiveram seu acesso à educação negado. Desde 1978, por outro lado, o mesmo PCC embarcou em um novo rumo e não poupou esforços para restaurar e modernizar o sistema educacional. O governo percebeu de forma brilhante que o país não tinha outra alternativa que não fosse investir na educação. Especialmente depois do ocorrido na Praça Tiananmen em 1989, evento organizado por estudantes, o governo adotou uma abordagem completamente diferente. Sonhando em ocupar as primeiras posições do ranking global de educação, uma ênfase na modernização e abertura foi adotada. Novas políticas foram implementadas, incentivando os estudantes a estudarem no exterior, naturalmente com a intenção de que voltassem à China posteriormente.
Até os dias de hoje, a febre por educação daquela geração continua inspirando estudantes, que escutam histórias de heróis como Chai Ling, um estudante líder dos movimentos que levaram à Tiananmen. A mensagem é clara: com foco nos estudos e trabalho duro, tudo é possível.
A esmagadora maioria da população chinesa acredita que boa educação é fundamental para se atingir o sucesso. A ideia de que você pode conquistar o que quiser ao estudar e trabalhar duro é padrão na sociedade. Essa grande ênfase na educação é parte essencial da cultura chinesa.
Porém, a enorme pressão e as condições extremas (9 horas de estudo/dia e 28 dias/mês) deixam cicatrizes mentais profundas. Logo, não é difícil de entender o porquê do suicídio ser a maior causa de morte entre os estudantes. A depressão também é comum e não é raro jovens que se sentem infelizes durante sua vida escolar.
Ao contrário do conceito ocidental de educação, que se concentra em desenvolver o indivíduo em vários aspectos, o estudante chinês é ensinado a memorizar e reproduzir grandes quantidades de conhecimento. A figura do professor onipotente é ainda central nesse quadro, onde os estudantes precisam aceitar tudo o que lhes é dito sem pensar de forma crítica. Capacidade analítica de interpretação é raramente usada, enquanto a criatividade é completamente negligenciada.
Uma economia que se torna cada vez mais voltada para inovação e alta tecnologia também precisa de pessoas criativas. O governo tem total consciência de que o sistema educacional atual é incompatível com sua visão para o futuro do país e admite a necessidade por reformas.
A China está passando um período de transição para os setores de tecnologia e serviços, cada vez mais se necessita de mão-de-obra qualificada. O programa “Made in China 2025” do governo, para tornar a China em uma potência tecnológica nos setores de TI e robótica, criou muitas oportunidades para estudantes dessas áreas e vem atraindo profissionais chineses e estrangeiros cada vez mais qualificados.
A Revolução Cultural negou educação a milhões de chineses oferecendo uma vida sem muitas perspectivas. Para estas pessoas principalmente, a educação é maior tesouro que se deixa para um filho e quanto a isto não se poupa esforços. Mesmo com muitos problemas no sistema, a educação é um valor inquestionável na cultura chinesa que deve ser aprimorado mais nunca relegado ao segundo plano. E nós brasileiros para onde vamos?
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